Quando pensamos em cidades inteligentes, a imagem que geralmente vem à mente envolve sensores, algoritmos e soluções tecnológicas para mobilidade, segurança e serviços públicos. No entanto, um dos pilares mais urgentes e, muitas vezes negligenciado, da inteligência urbana é a redução de acidentes de trânsito. Essa questão não é apenas um problema de mobilidade, mas sim um desafio de saúde pública com profundas implicações sociais, econômicas e humanas.
Um estudo apresentado no AMCIS 2025, desenvolvido por Daielly Mantovani, Douglas Cardoso da Silva e Guilherme Arevalo Leal, explora exatamente esse ponto ao aplicar uma abordagem data-driven para entender acidentes rodoviários no Brasil, com base em mais de 1,9 milhão de registros de acidentes entre 2007 e 2021.
A segurança viária é parte integrante do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 3 (ODS 3), que visa assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), os acidentes de trânsito estão entre as dez principais causas de morte no mundo — e no Brasil não é diferente. Somente em 2024, foram registrados mais de 6 mil óbitos por acidentes nas estradas federais.
Embora o Brasil tenha feito progressos nos últimos anos, com uma redução de 67% no número de acidentes entre 2010 e 2020, o número de mortes caiu apenas 38%. Isso revela um paradoxo: menos acidentes, mas mais letais. O indicador de letalidade (óbitos por mil acidentes) quase dobrou no período, passando de 47 para 83. Esse dado evidencia que não basta diminuir o número de ocorrências; é preciso agir sobre as causas mais letais dos acidentes.
O estudo inovou ao utilizar dados abertos da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e aplicar técnicas de ciência de dados, como Random Forest, regressão logística e SMOTE (para balancear dados desproporcionais), com o objetivo de identificar os fatores mais associados a acidentes fatais.
Entre os achados mais relevantes, destacam-se:
Pistas simples e vias rurais aumentam significativamente a chance de óbitos.
Acidentes com múltiplas pessoas envolvidas têm maior probabilidade de resultar em mortes.
Excesso de velocidade e ultrapassagens indevidas continuam entre as principais causas de óbito.
Acidentes noturnos são mais letais, embora ocorram com menor frequência.
Colisões frontais e atropelamentos, mesmo representando apenas 11% dos acidentes, são responsáveis por quase metade das mortes.
Além disso, foi desenvolvido um dashboard interativo permitindo a visualização em tempo real de indicadores como número de mortos por dia, tipo de acidente mais frequente, causas predominantes, entre outros.
Este estudo é um exemplo claro de como a inteligência urbana deve estar a serviço da vida. Ao integrar tecnologias de análise de dados com políticas públicas voltadas à prevenção, é possível transformar cidades em ambientes mais seguros, saudáveis e sustentáveis.
Investimentos em infraestrutura viária segura (como duplicação de pistas, sinalização inteligente, iluminação em áreas críticas), educação no trânsito, e fiscalização com base em evidências podem salvar milhares de vidas por ano. Cidades verdadeiramente inteligentes são aquelas que usam dados para agir com eficiência, equidade e empatia.
Além disso, políticas que visam reduzir a dependência do transporte rodoviário, incentivar diferentes modais e promover mobilidade urbana integrada também são estratégias cruciais para alcançar os objetivos da ODS 3 nas cidades brasileiras.
A alta letalidade dos acidentes nas estradas brasileiras exige respostas rápidas, precisas e baseadas em dados. O estudo reforça que a maior parte das mortes no trânsito é evitável — sendo causadas por fatores humanos como imprudência, falhas na condução e desrespeito às normas básicas de segurança. Isso torna ainda mais urgente a implementação de campanhas de conscientização permanentes, revisões nos padrões de habilitação e ações coordenadas entre governos, sociedade civil e setor privado.
A pesquisa liderada por Mantovani, Silva e Leal é uma demonstração clara de como a ciência de dados aplicada à segurança viária pode e deve ser incorporada ao planejamento urbano e às políticas de saúde pública. O futuro das cidades inteligentes não está apenas nos algoritmos que otimizam o tráfego, mas nos sistemas que evitam tragédias, protegem a vida e promovem o bem-estar de todos.
Reduzir acidentes e mortes no trânsito é mais do que uma meta estatística: é um imperativo ético e um passo decisivo para a construção de cidades realmente humanas, inteligentes e sustentáveis.
O texto completo de Mantovani, Cardoso da Silva e Leal (2025) foi publicado nos Proceedings do AMCIS 2025 (America’s Conference on Information Systems) e pode ser acessado aqui (https://aisel.aisnet.org/cgi/viewcontent.cgi?article=1081&context=amcis2025)
26/07/2025 18:24 - texto redigido com apoio do ChatGPT a partir do texto completo
@will_chen